quarta-feira, maio 31, 2006

Não pertenço a lado nenhum

Vamos fugir.
Queimo cigarros enquanto espero a presença de quem, carinhosamente, abraçará o meu corpo e quem sou. Não precisamos de confessar quem somos a quem nos conhece pelo olhar e que procura um pouco de paz entre estes dias que não trazem nada que nos diga. Podia divagar durante horas sobre como é tentar adormecer num quarto que teima em projectar nas paredes todo aquele passado que me dói constantemente ou como é acordar, para sentir um vazio invadir um peito cansado. Não me quero esconder mais entre os lençóis, sabendo que amanhã será igual. Já lutei tanto e por tanto, que toda a força que tenho vai sendo cada vez menos para tentar aguentar mais um dia como os que chegam. É por isso que te peço, foge comigo.
Caminho na cidade que me viu crescer, que de alguma forma, parece partilhar a dor que levo dentro de mim. E caminho em silêncio num fim de tarde onde o sol parece uma bola de fogo que cai no horizonte, lá no fim daquela via rápida, trazendo o esperado fim. Suspiro apenas por saber que nada do que possa dizer ou fazer seja capaz de mudar qualquer coisa que nos possa acontecer. Olho à nossa volta e sinto que vivemos num mundo de apatia, que por vezes é dominado pela angústia que nasce no nosso fundo. Talvez seja por isso que num final de tarde como este, vamos para um local deserto qualquer, ver o sol cair, sentindo a droga invadir o corpo, para que de alguma forma nos tornemos mais nossos e nos afaste de tudo aquilo que nos dói, doeu e doerá. A dor é tudo aquilo que sempre conhecemos melhor. O vazio é tudo aquilo que existe em nós e que vai aumentando, à medida que nos vamos tocando no fundo.
Só o meu pensamento é invadido por vozes, guitarras e batidas de bateria que me gritam e me rasgam a alma numa confusão ordenada, sentindo o fundo do meu ser, soltando um grito silêncioso no meu vazio.
O passado assombra tanto que é capaz de destruir o futuro e é nesse pensamento que nasce a angústia no presente que vivo, por saber que nada, mas nada, me espera na realidade.
O vento agita-me o cabelo e a droga atrofia-me os sentidos. Páro no tempo. Não pertenço a lado nenhum.

segunda-feira, maio 22, 2006

Preciso tanto do que não consigo sentir

Preciso tanto do que não consigo sentir.
Cada dia que acordo na cama do meu quarto, lembro-me de como o tempo desfigurou tudo aquilo que fui. Talvez porque não caminhe nesta vida vivendo mas porque caminho nela morrendo. Morro a cada dia que passa. Dentro de mim, nascem batalhas que perco sempre enquanto que a rotina de uma vida que nunca quis se faz sentir.
Quero ser crucificado por não desperdiçar tempo aos fins de semana para ir a um centro comercial ou ver a novela preferida do país. De não comprar constantemente coisas que a moda me tentou mostrar ou de não encontrar qualidade em tudo aquilo que uma multidão de gente segue cegamente. Não pertencer a um rebanho parece ser um crime que todos entendem, mas ter uma alma que é capaz de nos doer parece ser impossível. Começo a acreditar que não pertenço em lado nenhum.
Cada vez mais sinto a necessidade de fugir de mim mesmo e de tudo o que me rodeia. Porque tudo o que existe em mim são gritos de desespero que ouço constantemente quando estou neste quarto, ciente de tudo aquilo que lá fora me espera. Tudo o que existe em mim resume-se a um vazio que cresce à medida que me vou procurando dentro de mim mesmo numa viagem introspectiva que me dói bem lá no fundo. Tudo o que existe em mim, é a dor de ser quem sou e de não ser de outro jeito. É a angústia por um tempo que passa a correr sem uma vida conseguir agarrar, um desespero por nada nem ninguém entender como que é ter a solidão como a maior das nossas certezas. Tudo o que existe em mim é tudo aquilo que nunca quis. E por isso, desespero mais uma vez.
Talvez pertença aqui, a esta floresta longe de todas aquelas mentes que julgam e condenam numa balança injusta e parcial. Talvez pertença a esta floresta que me afasta de mim mesmo e onde me sinto abraçado pela paz desta natureza. Vou ficar por cá, com estas árvores que guardam nelas os meus suspiros e o rio que me lava a alma cada vez que fico longos minutos olhando-o fixamente.
Nada mais existe, a não ser este pedaço de terra e água. Por isso sorrio ironicamente para o céu azul que neste momento não me cai em cima, por saber que mais tarde ou mais cedo, vou acordar na cama do meu quarto, rodeado de tudo aquilo que me deixa cada vez mais a um passo da insanidade.


[9 meses. Para ti avó.]

segunda-feira, maio 15, 2006

Consegues ouvir o silêncio?

Consegues ouvir o silêncio?
Os lençóis da cama estão abertos enquanto queimo cigarros sentado no chão deste quarto. O meu poeta favorito vai chorando as palavras mais sentidas num mundo longe daquele que todos conhecem e eu, vou divagando, dentro de mim.
Os meus pais dormem no quarto ao lado, lutando numa vida que tentam sobreviver. Caíram no sono que lhes dá o único descanso que encontram no dia a dia de quem trabalha para não morrer. Tiveram o azar de terem um filho que sente no íntimo tudo aquilo que haja para sentir nestas madrugadas solitárias, para que neste momento lamente por se aperceber que não passa de um erro e um fardo para quem trabalhou toda a vida e nunca a ter conseguido aproveitar.
Não sou mais que um espermatozóide que cresceu num mundo onde as rosas morreram e apenas os picos se fazem sentir. Um ser que evoluiu para um estado de letargia por tudo aquilo que possa ter sentido até hoje mas que mesmo assim, continua a deixar os dias passar por ele, como se a dor não fosse suficiente. Tenho um cérebro que se limita a funcionar na pior das condições, sem a esperança de encontrar esperança, mesmo que isso implique a morte intelectual do meu ser. Não me preocupo em viver se me nego a toda a hora desde que ganhei noção de tudo aquilo que existe e do nada que sempre fui.
Não tenho palavras bonitas para oferecer, nem sorrisos para esboçar, a não ser os espontâneos e irónicos, cada vez que o mundo se revela como ele é todos os dias.
Fico no silêncio e na solidão. Não peço nem luto seja pelo que for. Não me incomoda se tenho ou não o direito de querer ou fazer qualquer coisa que supostamente fosse capaz de mudar positivamente a minha pessoa. Estou ciente de quem sou para saber que tudo o que possa acontecer nunca mudará quem sou, nem mesmo o mais bonito dos sonhos que possa ter escondido no meu inconsciente. Todos eles são razões para a mãe de todas as angústias acordar e me atormentar. Não me quero deitado neste chão em mais uma noite, perdido num turbilhão de sentimentos que não sou capaz de controlar. Não me quero, só. Porque não existe maneira de encontrar a paz que preciso.
Durmam e não se esqueçam que tenho um carinho especial por todos aqueles que sorriem inocentemente. Vivam.
Sou aquele que ouvem no vosso silêncio.

terça-feira, maio 09, 2006

Fui à pesca

Fui à pesca.
Os violinos fora de tempo que tocam dentro da minha mente quando este quarto é trancado pararam mal saí porta fora. Invadiu-me o silêncio que encontrei cá fora, nestas ruas vazias que me levavam até à floresta que todos os dias observo da minha janela, a floresta que tanto gostava de visitar durante a noite, com todas aquelas pessoas que fossem capazes de sentir a apatia que dançaria connosco.
Os pássaros saíam dos seus ninhos e esvoaçam entre os pinheiros que cerravam o céu cinzento. Eu continuava a percorrer os pequenos trilhos, entre toda esta vegetação que, por momentos, me faz esquecer quão cinzento é o meu mundo.
Sinto-me só e apetece-me vaguear pela floresta. Quero esquecer um mundo de livros e secretárias, notícias e televisões, obrigações, rotinas ou responsabilidades. Quero encontrar o momento ideal para conseguir tocar no meu fundo e não me doer de novo. Para que um suspiro seja capaz de esboçar um leve sorriso.
Consigo ouvir ao longe o pequeno rio que corre no meio desta floresta, longe de tudo aquilo que possa existir no resto do mundo. E quando lá chego, sento-me no chão e observo tudo aquilo que me rodeia em silêncio. A minha mente brinca com a ideia de explorar, correr, rir, abraçar, chorar e brincar aqui, em plena madrugada, com quem merece e procura algo indefinível. Fumávamos tudo o que houvesse para fumar, enquanto esta água corria sem parar. Levava para longe as lágrimas que nos saíssem da alma e trazia uma esperança que já não conhecemos. A minha força passiva só é sentida no meu olhar distante.
Coloco o meu isco e lanço a minha bóia. Por momentos não existe mais nada a não ser todo este ambiente que me observa aqui sentado, sem motivações ou optimismos inocentes, de cigarro na mão, à espera da primeira criatura que morda o anzol.

terça-feira, maio 02, 2006

Paralisei

Perdi-me no tempo. Paralisei.
Nada me espera no futuro a não ser a falta de vida que hoje constantemente sinto. Tornei-me numa mente que se lamenta todos os dias que desperta e não tenho qualquer orgulho nisso. Vejo os meus dias e as minhas noites como nunca antes conseguira ver. O tempo tornou-me frio e distante, mergulhado numa angústia que sinto intensamente. Sinto a falta de tudo aquilo que o tempo me possa ter levado para apenas ficar comigo mesmo, nesta dor de ser quem sou.
Já passei por noites que destinei serem as últimas mas a manhã teimava em aparecer. Sou provavelmente lixo humano que não se contenta com nada do que tem e que nunca teve força para lutar seja pelo que fosse.
Hoje estou aqui sentado. Sentado no meio desta imensidão de espaço, de cigarro na mão, tal como na primeira vez que peguei num, sentado numa rocha, naquele bosque que me levaram numa tarde de verão. Em frente a este computador que comprei graças a um folheto que encontrei no chão a caminho de casa à uns anos atrás. Com uma meia ás riscas pretas e vermelhas, que me ofereceram como luva, quando visitei a casa de uma rapariga que conheci na rua, numa fuga para o Algarve, onde dormi em locais que não fazia a mínima ideia de como se chamavam. Com uma camisa de flanela aos quadrados que comprei num leilão na Internet, que se tornou na peça de roupa que mais uso. Com umas sapatilhas que comprei com a única pessoa que foi capaz de entender tudo em mim e de me amar.
A minha vida dava o filme que todos os adolescentes deveriam ver.
Para quando o momento em que desistimos de nós mesmos chegasse, fossem capazes de lutar contra tudo aquilo que dentro deles possa doer e não se entregarem ao vazio que os consumirá, até que uma noite seja mesmo a última.